Transcrever emoções, sentimentos, passado, futuro ou desejos, é viver - ou reviver - tudo o que há de melhor.

sábado, 5 de julho de 2008

RECANTO DE PAZ

Céu azul cintilante, com algumas nuvens flutuantes, rodopiando sobre o ar, como gigantescos pedaços de algodão. O sol, enfraquecido e escondido entre as nuvens, apenas lança alguns tímidos raios quentes e dourados sobre o solo esverdeado. A grama, tão macia, se estende por sobre o chão, como um tapete natural de ''boas vindas''. Tudo aqui é tão imensamente belo, que meus olhos brilham, ao avistar o horizonte montanhoso, que está bem distante. Caminho sobre a estradinha de pedras escuras, em direção a uma gigantesca árvore, de tronco comprido e muitos galhos, dentre os quais, algumas centelhas de luz dourada do sol, escapam, como se fugissem para alcançar a qualquer custo, o brilho do sorriso irradiante que exibo neste momento. Meus pés quase não sustentam o peso de meu corpo. Ferimentos latejam, em vários lugares, mas mesmo assim, estou feliz. Nunca estive tão feliz. E sigo, rumo ao meu lugar especial.



O vento frio de início de inverno, velho companheiro de jornada, faz minhas vestimentas bailarem sobre meu corpo. E ao chegar aos pés da gigantesca árvore, decido me sentar e descansar. Encosto as costas sobre uma pequena parte lisa no tronco, e minhas costas cansadas agradecem. Minha espada, até então presa em minha cintura, cai sobre a grama, juntamente com minhas mãos, cobertas de hematomas. Esses hematomas... Me doem tanto, assim como todos os ferimentos em meu corpo. Mas esta dor, é um tipo de dor diferente. Uma dor, seguida de uma certa satisfação. Pois sei, que cada um destes ferimentos foram ocasionados por todas as batalhas que combati ao longo do percurso. As batalhas que enfrentei... nas estradas da vida.



Algumas lembranças surgem em minha mente... Lembranças das mais diversas.. Vozes, momentos, cheiros, pessoas... Sangue. Dor. Meu sorriso se desfaz quando vem a minha mente todas as ocasiões em que fui golpeado por alguma espada alheia. Alguns ferimentos formigam, e nem mesmo as pequeninas gotas de orvalho que caem agora sobre meu corpo me fazem esquecer a dor da derrota. Viver não é tão fácil, quanto se dá ao máximo para ser feliz. As vezes, a felicidade tem um preço muito alto, e quase nunca existe a certeza de que tudo ficará bem.



Batalhei, diversas vezes. Contra inimigos bem mais perigosos que qualquer monstro que habite as montanhas. Batalhei contra a dor, contra o sofrimento, contra a inveja, contra a falsidade... Sim, estes sim são inimigos de verdade, inimigos estes que sempre aparecem durante nossa jornada, e que muitas vezes acabam criando morada dentro de nós mesmos. E erguer espada e batalhar contra estes inimigos não é fácil, pois eles as vezes nos dão certezas e evidências que nos parecem tão exatas, que parece impossível seguir nossos próprios ideais e não se levar pela ignorância destas emoções.



Muitas vezes, estas emoções também nos levam ao erro de acreditar que para sermos felizes, e verdadeiros vitoriosos, temos que travar ferozes batalhas contra nossos próprios irmãos em humanidade. Estas emoções nos fazem crer, piamente, que se não impormos nossas vontades sobre os outros, mesmo que a força, não seremos felizes, e não passaremos de ''capachos'' da vontade das outras pessoas. Sim, pode parecer que estou sendo exagerado ao mostrar as coisas desta forma, mas com certeza, se pararmos e analisarmos as situações em que nos deixamos levar por cada uma destas emoções, veremos que as afirmações aqui contidas são verdadeiras. Pois eu digo, que se deixar levar e acreditar que a felicidade só virá com a imposição dos próprios ideais, é uma atitude extremamente errônea e até mesmo, covarde. Sim, pois a verdadeira batalha, aquela que nos representa um real desafio é aceitar cada pessoa da forma como ela é . Ora, se Deus, ou seja lá quem for que nos deu o direito de estar aqui, existindo, assiste a tudo sem interferências, respeitando nossa liberdade e independência, quem somos nós, humanos imperfeitos para acreditar que nosso ponto de vista está mais correto que de qualquer irmão nosso? Quem somos nós para tentar impor nossa própria vontade errônea sobre qualquer um?



Algumas folhas despencam de seus respectivos galhos, com a força do vento, e a luz do sol reflete sobre as superfícies molhadas de orvalho, fazendo com que cada folha tenha a aparência de pequeninas centelhas de luz cristalina. É incrível poder constatar, depois de tanto sofrer, a verdade por trás de cada erro. Quantas vezes não agi exatamente da forma que agora repudio? Quantas vezes não batalhei com meus irmãos apenas em prol dos meus interesses egoístas? Perco a conta... Foram tantas, que sinto um leve mal estar.


“Mas, e agora, 'cavaleiro andante'?” -pergunto para mim mesmo. Agora todas as coisas estão acontecendo de forma diferente. Tudo o que eu sempre desejei está fluindo até mim, lenta e prazerosamente... Cada vez mais. Um simples toque, um pensamento morto, um pássaro que segue seu caminho ao horizonte desconhecido. Tudo o que eu sempre desejei ser, eu serei, e enquanto tiver esta espada, revestida de coragem, nada, nem ninguém vai conseguir me deter rumo ao caminho da felicidade plena.



Muitas vezes, também, me perguntei ao longo de minha existência: O que será esta “felicidade”? Acredito não ser o primeiro a me questionar sobre tal coisa, e acredito também não ser o primeiro a não chegar a um conclusão exata. Mas há uma resposta simples, porém incerta, para esta questão: A felicidade não é exata por que que cada ser tem uma própria visão de como ela é, de verdade. Alguns acreditam ser o amor, outros acreditam ser as riquezas, outros a iluminação espiritual e ainda há outros que acreditam ser os mais diversos prazeres mundanos. Sim, e eles estão corretos em certa parte, certos, pois a felicidade é apenas um estado de espírito, um dos sentimentos aliados nas batalhas contra as emoções destrutivas, e este estado de espírito pode acontecer com qualquer um, em qualquer lugar, mas de formas completamente diferentes. E pode durar muito, como pode durar pouco.



A busca pela “felicidade plena”, que considero o estado de felicidade permanente é o que o animal chamado homem passa a sua existência inteira buscando. Em vão, pois, na grande maioria das vezes, apenas no leito de morte que conseguimos compreender que a felicidade plena é viver. É estar aqui, neste momento, respirando e existindo, apenas tendo o magnífico dom de poder enxergar este lindo céu azul que contemplo neste momento. Deste paraíso em que descanso neste momento, viver não parece tão difícil assim. As coisas parecem mais simples, e ao mesmo temo mais intensas. Incrível como tudo pode se transformar com apenas uma mudança na forma de enxergar as coisas. Magnificamente incrível.



Em breve, estarei mais uma vez sobre o lombo de meu corcel, cavalgando com a espada em punho, vivendo as mais intensas aventuras que as estradas tortuosas da vida conseguem me proporcionar. Mas, por ora, continuarei deitado sobre esta grama tão macia, cuidando dos meus ferimentos, e de minhas cicatrizes. Do passado, apenas tirarei as lições de vida, as lembranças felizes, e os fiéis irmãos e irmãs que me acompanharam, e de alguma forma batalharam em alguma aventura comigo


Lentamente, meus olhos pesam... E já não consigo resistir a tentação de fechá-los. E ainda mais devagar, vou adormecendo, enquanto mergulho em sonhos de um futuro feliz.