Transcrever emoções, sentimentos, passado, futuro ou desejos, é viver - ou reviver - tudo o que há de melhor.

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Mendes, Ricardo. Setembro de 2011.


Caros amigos, alguns de vocês já sabem de minha história. Sou eu, Ricardo. Alguns me chamam de Mendes. Em verdade, só me chamam assim nas clínicas psiquiátricas que frequento. É por culpa dos doutores e doutoras de tais clínicas que estou aqui escrevendo. Recomendaram-me que usasse uma espécie de diário para aliviar todas essas coisas que acontecem em minha cabeça ou em minha vida. Me disseram que estou um tanto doente, mas que posso me curar.


O que lhes conto hoje é que, na noite passada, fui parar num motel barato depois de muita vodka – lembrei-me de Camila, amigos. 
A garota que me acompanhava estava tão alcoolizada quanto eu. Tinha olhos castanho-escuros, cabelos vermelhos, pele clara e chamava-se Karen. Era um tanto atraente, amigos. Perguntei-me mentalmente como é que eu acabava com pessoas mais atraentes que eu, deitadas ao meu lado em uma cama de motel.
Beijei-lhe o pescoço, o colo, os seios, e tivemos trinta e cinco minutos agradáveis. Se quiseres, dê asas à vossa imaginação. Não entrarei em detalhes. Fato curioso foi encontrar-me desesperado para sair dali.
Apesar de ser um motel um tanto barato, havia uma banheira no local, a qual enchemos, entramos, e onde ficamos conversando. Ela acendeu um cigarro de cravo e ficou criticando minhas pernas cruzadas dentro da banheira. Calculei quantas horas dormiria para acordar já na hora de deixar o motel. Estava inquieto e mal conseguia disfarçar.
Karen começou alguns assuntos algumas vezes, mas eu estava distante. Vou-lhes ser sincero esperando que nenhum julgamento seja a mim direcionado: eu estava envolvido com outra pessoa. Acho que sentia uma dose de culpa ao pensar nela. Karen falou sobre morte, e eu tive vontade de largá-la na banheira. Não tentei disfarçar e fui deitar-me. Não dormi mais que uma hora, minha senhora. Acordei e liguei a tevê. As horas arrastaram-se. Desejei ter um bom livro ou muito álcool.
Amigos, tomei a decisão mais improvável. Adiantei meu relógio e o celular da Karen em duas horas. Não conseguiria aguentar por muito mais tempo. Acordei-a e disse que precisávamos ir embora.
Levantamo-nos e saímos do quarto, passamos pela recepção e chegamos à rua. Meus pensamentos ainda chegavam à Millie. Millie, caro leitor, é o nome da garota com a qual eu me encontrava envolvido. Disse à Karen que eu precisava correr pra casa de um amigo e pegar uma coisa que tinha esquecido. Ela não acreditou muito, mas não me importei com isso. Duas horas mais tarde recebi uma mensagem da Karen, que me perguntava se eu me encontraria com a outra. Senti enorme arrependimento por ter passado a noite a seu lado.

Querido leitor, se já me julgastes por ter passado a noite com Karen estando envolvido com Millie, sugiro que encerre por aqui a leitura. 

Seis horas mais tarde eu estava abraçado com Millie, e, caro amigo leitor, ela era impossível de segurar. Jantamos juntos, conversamos, rimos, e, ainda assim, eu não sentia-me atraído por ela. Ela usava a droga da língua demais, e por isso eu tinha de me esquivar pra não ser atingido nos ombros,  pescoço, queixo e bochechas - era uma cena um tanto ridícula, e acredito que algum possível espectador estava rindo-se ao assisti-la. Tive a mesma vontade desesperada de voltar para casa, mas não foi o que fiz.
Querido leitor romântico, se até agora não encerrastes a leitura, mereces sofrer com o desfecho desta história, e não darei conta dos detalhes para assim adiantar ambos: final da história, e teu espanto. Dormi com Millie no mesmo motel que acordei com Karen. Pedi o mesmo quarto, e enchi a mesma banheira.

Não escreverei nem mais um parágrafo, leitor querido. Ouvi um barulho vindo do outro lado do quarto: acho que Millie está despertando.

quinta-feira, 12 de julho de 2012

Divagarei um bocado, amigos. Por favor, sejam pacientes



Sinto enorme agonia neste momento. Tenho andado pouco deprimido. Quase posso dizer que há uma ponta de felicidade em mim. O problema é que sempre me lembro de que o que estou fazendo vai contra o que acredito. Mil perdões. Eu lhe devo mil perdões. Não mereço teu braço, teus lábios e teu colo. Tentei te avisar, mas sou fraco por demais.

Se ao menos você soubesse o quão pouco te mereço... Sou um ser humano detestável. Tenho plena noção de meus atos, o que me torna ainda mais detestável. Não lhe mereço, minha senhora.

És demasiado pura para envolver-se com tamanho problema. É exatamente o que sou: um problema. Os livros que li, as canções que escutei, as pessoas com as quais convivi, os filmes que assisti e ainda um par de outras coisas, me tornaram o que sou: um ser totalmente desajustado a esta sociedade. E não me julgo errado, cara senhora. Mas meu julgamento é um tanto diferente do seu. Não te mereço.

E não te devo explicações, te devo liberdade. Te arranco a liberdade com a língua. Sou um ser humano deplorável.

E oitenta pessoas me tentam salvar. Pobres diabos. Não entendem que não se pode impor a droga da salvação à pessoa alguma. Não quero ser salvo, quero distância de seus ideais e tenho pavor de me tornar alguém que seja até mesmo suavemente parecido com vocês. Eu vos odeio, salvadores.  Prometo pedir ajuda se um dia desejar me render à vossa podridão, mas, enquanto isso, não me salvem.

E não aceito vossos julgamentos, meus senhores. Não os aceito pelo simples fato de vivermos em diferentes mundos mesmo que dentro da mesma sociedade. Podes pensar o que quiser sobre quem quiser, assim como posso pensar o que quiser sobre seu pensamento. A liberdade muito me ensinou. 

segunda-feira, 9 de julho de 2012

Palavras sobre o á...


Tentar descrever tão singular sensação é um tanto complexo. 
Sente-se certa queimação no estômago e torpor tremendo. Por vezes a felicidade é momentânea. Esquecemo-nos de coisas mais sérias e mudamos nossas prioridades. A felicidade é momentânea, mas sublime. O estômago é, de fato, um espetáculo à parte e merece, também, a repetição: um mix de queimação com um delicioso balanço. 
Vez ou outra há um sorriso bobo estampado em nossos rostos. Nossas atitudes mudam e perdemos uma dose de cautela. Ficamos avoados. Por vezes divagamos e ainda outras vezes temos o pensamento fixo em um único alvo. Às vezes cantamos e agimos feito tolos.

Engana-se quem acha que o assunto é puro. Exatamente o tipo de destruição pela qual tenho procurado.

domingo, 1 de julho de 2012

Sobre a Libertação Animal


Tatiane, dona de 16 anos, estava sentada numa mureta mirando as gaiolas vazias que foram outrora habitadas por infelizes galinhas.
Tati, como era chamada por todos, era vegana desde seus onze anos, e se encontrava agora em meio a um impasse: as gaiolas vazias a deixavam feliz, mas a causa do vazio das gaiolas era o falecimento de seu tio, que além das galinhas criara também porcos e bois para o abate. O falecimento de Roberto, seu tio, a entristecia, e eis o impasse.
Deveria ela contentar-se com a morte de alguém por este fato resultar no fim do sofrimento de outrem? E principalmente quando este alguém fora um ente querido?
O calor a todos castigava. Os rapazes não vestiam camisetas e as garotas usavam biquínis, com exceção de Tati, que trajava um belo e leve vestido.
A lembrança da morte de seu tio a angustiava, mas também a recordação das galinhas que mal conseguiam virar-se a chateavam. Assim é a vida: a criação de um problema resolve três outros, enquanto a solução de um problema é a causa de outros oito.
Ainda que a morte de seu tio fosse ofuscada ou justificada pela liberdade de outros animais, deveria Tati comemorar? Não estariam outros cinco criadores de animais nascendo neste exato momento? E ainda que não, com tanta luta pelo dinheiro, não seria possível dizer que as empresas aumentariam a produção, compensando a morte de qualquer pobre diabo que criara animais para transformá-los em comida, para assim suprir a demanda? Não há porque comemorar a morte de um opressor se para ele houver um substituto.
Cada pessoa que comprava e comia um bife era um opressor. Se não era o assassino, era o mandante do crime. Julgue qual o pior. E há toda a sorte de desculpas: Alguns usam outros animais como apoio, “mas o leão come carne!”. E ele também dorme em qualquer lugar – não em uma cama confortável – e não se importa com o dinheiro. Não vejo muitas pessoas seguindo seus passos neste sentido.
“Temos a capacidade de organizar as ideias e pensar de forma lógica, diferente deles. Que estúpida comparação!” Todos que estavam à sua volta a olharam, alguns viraram-se para encará-la e outros, esses mais discretos, a olharam com os cantos de seus olhos. Tati estava perdida em meio a seus pensamentos e nem havia percebido que falava em voz alta. Ela sorriu e levantou os ombros como quem perguntava “Quê posso fazer?”
De volta a seus devaneios, Tati imaginou outra desculpa: “É a cadeia alimentar”. Mas o que diabos isso deveria significar? Se o mais forte deve sobreviver, deveriam os homens mais franzinos serem devorados por brutamontes?
Outros diziam que a carne era demasiado gostosa. Ora, quando alguém mata um ser humano por prazer não pode usar tal desculpa para não ir pra cadeia!
Há pessoas que se apóiam no comodismo e dizem: “Mas é muito difícil repor as vitaminas!” o que é uma grande mentira. Nada garante que uma pessoa que tenha a carne inclusa em sua dieta seja mais saudável que um vegetariano. Além disso, ainda que fosse muito trabalhoso repor as vitaminas... Bem, posso roubar um açougue ao invés de trabalhar e conseguir o dinheiro pra comprar a carne? É um tanto mais fácil! Então roubar alguém para melhorar e facilitar a minha alimentação não é certo, mas não há problema algum em tirar uma vida com o mesmo propósito?


Continua...