Vincent estava encolhido ao canto de seu quarto, cabeça
recostada na janela, e braços envolvendo as próprias pernas. Sua cabeça
latejava. Olhou para as seis cicatrizes em seu pulso esquerdo. Eram marcas de
sua não-aceitação. Durante vinte e cinco anos as pessoas o conseguiram
convencer de que não era natural. “Mas que diabos!” – pensou – “consomem
comidas artificiais todos os dias e me jogam esta história de não-natural.”
Seis malditos cortes. Seis malditas tentativas de acabar com o sofrimento. Seis
malditas vezes em que tentou arrancar de si mesmo o que o fizeram acreditar não
ser natural. Agora era diferente. Dani estava em sua vida.
A sexta vez funcionou. “Imagino como teria sido se eu tivesse
sangrado um pouco mais. Jamais teria conhecido Dani. Dani jamais me conheceria.”
Queria acabar com sua vida, e conseguiu fazê-lo. Era o final de uma vida de
auto-segregação. A partir deste dia, passou a lutar contra seus próprios preconceitos.
Passou dias encerrado em seu quarto refletindo. “Para o Diabo com todas estas
pessoas. Uma mentira contada por todo o mundo não constitui uma verdade.” No entanto,
ainda reconhecia, com pesar, as mesmas dúvidas, os mesmos questionamentos, e os
mesmos preconceitos que ele outrora tivera, nas cabeças de algumas pessoas. “Passei
por isso, e com um pouco de sorte eles também superarão. Mas algo precisa ser feito.”
- Cerrou os punhos e estufou o peito. - “A melhor maneira de mudar alguma
coisa, é dar o exemplo. Não serei mártir algum, mas não mais partilharei do
censo comum. Não mais veicularei o preconceito em meu discurso.” Sua cabeça
ainda latejava. Olhou para as cicatrizes e apertou as mandíbulas. Sentiu o
celular vibrando em seu bolso frontal direito. Enfiou a mão dentro do bolso em
busca do aparelho, reconheceu o número, e sorriu largamente – “Daniel deve
estar sentindo saudades”.
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