Vincent acordou, mas não abriu os olhos. Ficou parado na
mesma posição por aproximadamente dez minutos, e então, ainda deitado na cama,
abriu os braços e esticou as pernas para espantar a preguiça. Seu braço direito
bateu em algo que, ao sentir a pancada, moveu-se. Vincent abriu os olhos e
virou o pescoço. Sentiu um súbito calor no estômago e não conteve um pequeno
sorriso. Estava feliz, mas tinha vontade de chorar. Não pôde mover-se por
outros dez minutos. Não sabia que sentimento era aquele, mas era algo
inusitado. Passados os intermináveis dez minutos, levantou-se muito cuidadosamente,
contornou a cama, sentou-se de frente para o corpo que em sua cama descansava,
e pôs-se a observá-lo. Sentia um misto de sentimentos. Jamais enfrentara tantas
sensações em tão curto espaço de tempo.
A princípio pensou estar fazendo algo errado, não-natural. Desviou
o olhar daquele rosto imaculado e encarou as paredes. Buscou desesperadamente
por uma distração. Tentou descobrir de onde viera aquele pequeno buraco na
parede, tentou lembrar-se qual fora a última passagem de “Fausto” que lera, tentou confirmar quais eram as coisas que precisava incluir na lista de
compras, mas nada disso o impediu de lembrar-se da noite anterior. Vincent
forçava as mandíbulas e repudiava suas próprias ações. Dois minutos mais tarde,
desejou volver àquela noite e reviver as emoções. Levantou-se, foi até a janela
de seu quarto e calculou a distância entre janela e calçada. Aproximadamente
três metros e meio.
Voltou o olhar para o corpo desnudo, e desconfiou de sua
própria desaprovação. O descoberto corpo que despojava-se de
preocupações voltou a atraí-lo. Desconcertado, Vincent julgou desprezível e
desdenhou de seu despreparo para lidar (tão desesperadamente!) com a situação. Nada havia de errado com
o corpo de Deodoro, presente de Zeus.
Vincent precisava enfrentar seus preconceitos, e estava
disposto a fazê-lo. Aproximou-se de Deodoro, beijou-lhe a testa, o nariz e os
lábios, mostrou-lhe um sorriso e muito afeto. Voltou a contornar a cama e
deitou-se, agora pouco menos preocupado.
Muito Bom! Intenso! A não aceitação começa por nós mesmos! Mas aos poucos a sociedade vê que o importante são as qualidades das pessoas independente de sua cor, suas formações, suas orientações políticas, religiosas e sexuais!
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